A moral, as criancinhas e o pequi.

5 de mar. de 2010
O comportamento dito "moralmente aceito" é tema de divergência, luta armada (!), pré-conceito, conceito. Existe consenso? Claro. A sociedade em parte é isso, consenso moral. As criancinhas discordam - não faz mal, elas servem pra isso. Um exemplo central da moral? Sempre elas, as vestimentas (?); use-as ou deixe-as. Use-as sempre e deixe-as para serem lavadas. A sujeira incomoda o papa, não se esqueça. A moral do papa não é a moral criada pelo papa. A moral do papa é a moral com a qual o papa convive, concorda. O papa aqui não manda nada. Tudo bem, ele é chefe da igreja, comanda a instituição mais controladora da terra depois da pornografia. Então, suponhamos que participe indiretamente da moral dos outros, que é a sua, por fazer parte "dos outros". E o pequi? Fruta amarela. Impõe sua moral nas ruas. Colore as lixeiras. Empresta seu odor às massas (Grande frase!). Diverte os lábios, ativa a memória e tem espinhos. Essa parte dos espinhos entra no processo moral. A moral nata do pequi. Oferece seu sabor e impede-nos de mordê-lo. Barra o pressuposto da fome que "exige a destruição do apreciado" na metade. Moral também é isso. Fruta de moral, o pequi. A cor da moral: o amarelo. O comunismo é vermelho, a São Paulo é cinza, a paz é branca, o passado é negro, o céu é azul e a moral é amarela. Alguém discorda?

Abstraia e aleluia!

Arrume tudo!
Guarde nos armários.
Não é pecado, ponha a cruz na gaveta.
Olhe pro teto, tampe as rachaduras.
Não deixe a história te confundir...
Assim se fez o universo, arranjou-se.
Pense menos na sujeira, a poeira é seu início, lembra?
Tape os bueiros, a água arranjará suas galerias sozinha.
Faça um voto à castidade dos sonhos, conserve-os puros.
Tranquem na geladeira os filhos, antes eles não existissem.
Que alívio a solidão assistida por si mesmo.
Abstraia, e te observe do alto.
"Espectador da própria existência”

Recesso

No tropeço que eu dei
Durante esse processo
De quase cair,
Entrei em recesso.
Pensei no chão perto
E ainda, na vida
Não tinha resposta, era isso!
A pergunta bateu na cabeça!
Eu poderia ter saltado a pedra.
Mudado de rumo, virado e saído.
Voltado calado e dormido.
Ah!, eu prefiro o tropeço,
Ao tédio.

Tragédia

23 de fev. de 2010
Uma carabina, duas balas.
Possibilidades infinitas.

Amor perfeito e risos.

Escondo todo o desprezo que sinto
E traço a certeza do amor perfeito
Sem pontos, vírgulas, defeitos
É raro, mas é possível.

Inspiro e prendo o ar
Deixo encher o peito
Apontam os mamilos:
É o mais perto que chego.

Fecho bem o olho esquerdo
Escondo com a mão o direito
Os dois lados escuros:
É amor com respeito.

Deixo um bilhete curto
No piso sujo do quarto
Espero que ela ache
E me ame.

Um, um.

Reflete a falta do que fazer: poema.
Reduz qualquer luz quadrada.
Janela, quadro, mesa, cabeça...

Prece.

Quem dera ao triste fim de um garoto.
Sofrido, machucado, em canto escuro,
Ah! Ouvir um som de rato do esgoto,
Tocando um tambor bem vagabundo.
É pouco, eu sei, é muito pouco.
É nada, é som de bicho, é som imundo,
Sou louco, eu sei que sofro, eu sei que tudo:
É parte, é muito pouco, é raso e fundo.

No meio o devaneio, o João, a Joanna.
Acabe, rasgue a roupa, pise forte.
Atrase, lave o cabelo, mude o corte.
Na trave com o goleiro, a bola, a morte.

Segure na mão do mestre, clame, chore.
Reclame seu destino de humilhado,
Quem sabe, quem nunca sabe, quem sabe e cala,
A fala quer de presente um namorado.

Esconda sua miséria no travesseiro,
Mas antes guarde um papel que prove tudo.
Gavetas, imagens santas e dias tortos.
É muco, é muro sujo, é o fim do mundo.

Um, dois, três, aleluia!

Quando tenho pausa no velar da vida, reflito: procurar é sempre a chave pra encontrar aquilo que não se perdeu. Meu olhar procura a casca da ferida no tapete, encontra a lasca de madeira da cruz. Sem sentido como a água que flutua sobre o copo, absurdo como as curvas da luz. Se procuro em algum canto, ouço dentro o terremoto, falham as pernas, os sentidos. Um achado tão fantástico, mentido, sumido entre os frascos coloridos. São passos que o "se" há de dar.
- Onde você perdeu o senso?
- No inferno, quem sabe. Vai buscar?

Do "ir"

4 de fev. de 2010
Quando a palavra foge
Tudo em volta faz sentido
É um momento, um destino, um suspiro.
É talvez a morte perto,
Sem vento, grunhido.
...e vem à boca, quase pula,
E volta cansada,
E cala.

Vera

Granulada e torta,
Forte e meio santa.
Fria. É concreta.
Nasceu pura e sem encanto.
Se soprar o vento ela não muda,
É sólida, plantada, firme.
Nunca vai embora...
É negra, é branca.
Tranqüiliza e apavora.
Alivia:
E mata.
Eu a escolhi.
A verdade, minha e sua.
Triste feito a morte.
Pilar púrpura da existência.
Inabalável: é ferro quente.
Insuportável: machuca.

Calar

2 de fev. de 2010
Plantei meu alicerce no vento...
Fingi que era feliz...
Perdi minha identidade...
- É segredo!

Então vamos.

26 de jan. de 2010
Na fresta de borracha

Pequena como farsa

Espreme-se calada

É pedra.


Caminho da escola

Suor de testar bola

Na trave de concreto

É muro?


A pé é mais bonito

Tender ao infinito

Jogar pra frente, ir...

Escolher o caminho

Parar, olhar um ninho;

"É pardal, deixa aí.”

"Então vamos!”

Colheita.

25 de jan. de 2010
Eu escrevo pra juntar - de viver a gente já separa. O "objeto" do escrito é fragmento, não tem todo e nem é parte; parte é o inteiro separado. O fragmento - coitado, tá solto feito gato preto em telhado branco. Fragmento é o oposto de cimento. 
Juntar. É o que faço. A matéria (!) flutua e condensa na folha. Vira letra atrás de letra, pé de página, anúncio de vida, de morte; tão próxima: trecho, verso, vulto. Estanco o corte e deixo aberto, sangrar sempre fez parte - e o sangue flui da pele branca. E o branco da pele é vida, estranho isso...
O fim é o escuro, a memória que se fecha. Esquecida é negra, o menino não enxerga.
Escuridão é outra coisa: paraíso do Poeta, descanso, tinta preta.
E tento, persigo as coisas (sempre elas), catando pedaços, buscando uma massa consistente, há de ter liga essa vida!

Quero todos

19 de jan. de 2010
Hoje, quero mais do mundo em mim:
Cada pedaço solto no vento
Os que caem ao chão no correr e ficam.
Quero um muito que não seja fácil
Por pouco que pareça ser falta
De tanto que em mim guardo.
E os raios do sol, quero todos
Trancados em arder no peito.
Quero uma bacia de água morna
Pra lavar os pés dos estranhos
E as mãos de todas as mães.
Eu quero um monte de qualquer coisa
Transbordando em sentimentos
E se topo com alguém que queira livre
Sigo.
Hoje, eu quero mais do mundo em mim.

Coice.

E o amor foi-se.
Viver é chumbo!
Por cima de queda, coice.

Naftamor

Amor de naftalina:
Começa no nhenhenhem
Termina na novalgina.

Andar.

11 de jan. de 2010
Bloco de arame com cimento:
Concreto.
Pote de mármore: frio e feliz:
Vasilhame.
Reduz a luz do sol num qualquer círculo:
Bola.
Reflete a ponta torta do nariz:
Iz.

Enfim.

Desabafo:
Pedra, papel e tesoura.
Papel.
Pedra.
Tesoura.
E dói.

Verão

Cármen, ando pela sala
Sem pensar em rima
Digo, dessa estranha oxigenação
Que você insiste em ter com o ver
[ão

Junto, grudado e distante

6 de jan. de 2010
Abraço de rio comprido
Riso de lago quieto
Voando, cai perto
E se afasta na correnteza...
É distância de pedaço pouco
De certeza acabada no vento
É grude eterno-passageiro
É adeus breve de momento.